Neste blog disponibizo atividades ligadas ao programa Gestar II desenvolvidas por alunos da rede Pública Municipal, fotos dos alunos que participam dessas atividades, comentários realizados pelos alunos e pelos professores, planos de aulas e relatórios de atividades dos professores. Os visitantes são convidados a realizar comentários positivos e mandar sugestões.

18/11/2009

Eu E O PSEUDO EU LEITOR. Vivências, horizontes e perspectivas

Por pouco não nasci escravo. Se a Inglaterra, ávida por consumidores, não põe em prática o seu projeto de expansão industrial, obrigando, por grande força, o Brasil a acabar com a escravidão oficial, certamente ainda estaria sobre julgo do chicote. Talvez não tivesse nem nascido, pois a minha bisavó por parte de mãe viveu numa casa-grande no Espírito Santo e o meu pai era descendente de italianos. Sim, daqueles que concebia o ser humano a partir de suas características fenotípicas. A cor da minha mãe foi a primeira barreira a ser transporta para a minha existência. O meu pai... um herói!

Nasci no estado do Paraná, em plena crise agrícola. Aos 3 anos tive que enfrentar uma viagem de milhares de quilômetros, em cima de um caminhão, em busca de terras, que na época eram oferecidas, pelo Governo Federal, através do programa de Assentamento denominado Sidney Girão. Fomos morar na Linha 14 B do projeto. Para vir ao centro urbano mais próximo, tínhamos que andar 4 quilômetros a pé e “pegar” o ônibus que passava na chamada linha D.
Sobrevivemos quase 5 anos naquele lugar hostil e insalubre; o sonho foi interropido por um problema de saúde do meu pai, obrigando-nos a deixar o sítio e vir morar na área urbana. Fomos morar em Guajará-Mirim em 1982. Ano da Copa. Conheci a TV, a copa e as letras nesse mesmo ano.

Da 1ª a 4ª Série estudei na escola Alkinda Brasil de Arouca. Empolgado com os estudos, estava sempre aprovado no terceiro bimestre. Não tinha livros, mas sempre dava um jeito de lê-los. Lembro-me que terceira série a professora me deixou ficar de férias um mês antes dos demais alunos. Nesse tempo ganhei, de uma tia, um livro cuja história lí e relí várias vezes. Era o único que eu tinha. Nessa época não tínhamos energia elétrica em casa e televisão era uma vez por mês quando íamos na casa de algum conhecida para assisitir desenhos. A conclusão do Ensino Fundamental (no período chamado de Ginásio – 5ª a 8ª Séries) se deu na escola Irmã Maria Celeste. Uma escola que fez parte da História do Brasil, pois foi Inaugurada pelo Presidente da República, João Baptista de Oliveira Figueiredo, em visita a cidade Pérola. Recordo-me com muita nitidez do dia. Tive que voltar sozinho para casa, pois me perdi dos meus colegas no meu da multidão. Que desespero foi aquilo!

O Ensino Médio era profissionalizante e não coube a mim fazer a escolha entre os quatro existente na minha cidade. A escolha fora feita pela direção do Seminário Diocesano de Guajará. Isso mesmo! Antes de me casar, fiquei três anos no seminário católico estudando para Padre. Por mais incrível que pareça, não saí de lá para me casar, aliás, nem mesmo foi por minha vontade própria. Fui mandado embora. Até hoje não entendi ao certo o porquê. A única coisa que deu para descobrir foi que eu falava demais. Fazia muitas perguntas, queria saber de tudo. E o pior: queria que os padres colocassem em prática aquilo que pregavam. Vejam só! Recordo-me um dia que causei a maior confusão ao propor que fosse reduzida a quantidade de nossa comida para dar a pessoas que passavam fome. Não agradei. Esse período na seminário foi muito significativo para o meu processo de leitura. Tìamos uma boa biblioteca e acabei por criar o hábito da leitura. As leituras dessa época, de certa forma, foram fundamentais para delineamento da minha personalidade.

Terminado o magístério (1992) e agora fora do seminário, fui trabalhar como professor numa escola particular. Apesar de não ter sido eu a fazer a escolha pelo Magistério, acredito que foi uma decisão acertada. Mesmo não ganhando muito, a profissão sempre me permitiu estar empregado e manter o vínculo com os livros e as leituras. No final de 1994, já namorando a minha atual esposa, fui a São Paulo para uma experiência de 30 dias no Seminário Paulino (Leia-se Paulus Editora). Foi minha primeira experiência longe da família. Na Paulus editora vivi livros todos os momentos do dia. Conhecí e participei de todo o processo de editoral, diagramação, impressão e distribuição de livros. Coisa impressionante.

Ao retornar de minha experiência em São Paulo fui trabalhar numa repetidora da TV CNT. Na época, estava no seu melhor momento com apresentadores como Ratinho (agora do SBT). Comecei como operador de VT e cheguei a apresentação de Telejornal. Iniciava-se aí uma nova fase de minha vida de leitor. O contato com o microfone me deu oportunidade de, nas horas vagas, ir treinando para ser locutor da rádio que em breve seria inaugurada. Ser locutor era um sonho, antigo, alimentado continuamente. Passei a freqüentar o prédio ainda em construção.
Em setembro de 1995, o então Senador de República Odacir Soares esteve na cidade Pérola para Inaugurar oficialmente a Rondônia FM – 89,9 MHz. Era 7 de setembro. Logo na primeira semana de funcionamento começaram os testes para a contratação de locutores. Nomes conhecidos estavam por lá. E eu no meio deles. Uma semana depois estava estagiando.

Logo que efetivado, fui convidado pelo diretor da rede Rondônia de Rádio, Herivelton José, para fazer um estágio de aperfeiçoamento na rádio de Rolim de Moura. A idéia era levar o sistema de trabalho existente na Rádio de Rolim para a de Guajará-Mirim. É nesse período também que Universidade de Rondônia faz o primeiro vestibular para o curso de Administração. Uma vaga, das 80 ofertadas, foi minha.

Ao retornar de Rolim de Moura, encontrei uma equipe hostil a mim e a tudo o que eu pensava. Mas não me dei conta disso nos primeiros momentos. A minha alegria de viver, o prazer que tinha de fazer o que sempre sonhei não me permitiu dar oportunidade as dissabores promovido pelos colegas de trabalho. Investi na minha profissão. Lia, estudava, escrevia. A minha dedicação logo rendeu reconhecimento público. Era o locutor da moda. Qualquer grande evento, o meu nome era inegociável. Políticos e comerciantes queriam associar seus nomes e produtos ao meu. Essa fase foi coroada com 4 moções de reconhecimento de quatro entidades: Câmara Municipal de Vereadores; UMAM – União Municipal das Associações de Moradores; Polícia Militar de Rondônia – 6º BPM e Pillon Publicidades.

À medida que crescia profissionalmente, crescia também a pressão dos companheiros de trabalho e de outros seguimentos da sociedade que passaram a me ver como um possível adversário político, haja vista não pertencer ao grupo de famílias tradicionais de Guajará-Mirim. Lembro-me que a direção da Rádio era pressionada a me demitir. Recusei o convite do meu diretor – Antônio Luis de Macedo – para ser candidato a vereador em 1996. Meu negócio não era a política, mas locução.

O meu interesse por um curso universitário foi tardio. Somente após três de ter concluído o ensino médio (2º grau) foi que me despertei para fazer o vestibular. Optei, na euforia da Área de Livre Comércio, pelo curso de administração. Seria a primeira turma a entrar no campus de Guajará-Mirim. Aprovado no vestibular, ingressei na universidade ainda sem prédio próprio. As aulas aconteciam na escola Saul Bennesby. Depois, mudamos para o Durvalina de Oliveira. Acompanhei de perto muita das iniciativas do Campus para estruturar a Universidade. Em todas, estava à frente a figura do professor Dorosnil Moreira. Personalidade conhecida na cidade, peça fundamental no processo de interiorização da Universidade Federal de Rondônia, odiado pela dita elite política de Guajará por fazer chegar no município um leva de professores graduados para dar aulas. Mas sobretudo valente, destemido, sonhador e revolucionário.
Concorria com a Rádio o meu curso universitário. No embate, vencia a paixão. Mesmo não faltando às aulas, não havia em mim uma dedicação ao curso de Administração. Fazia apenas o necessário para alcançar uma nota que me permitisse passar na disciplina. Fiz bons amigos. Tentei ser um bom amigo.

No início de 1997, a situação ficou insustentável. Havia trabalhado na campanha do vereador mais votado da cidade e fui ocupar a Assessoria de Impressa da Câmara Municipal de Vereadores. Leitura e escrita agora não era mais somente uma questão de gosto, mas de profissão. Tudo foi se avolumando e me deixando decepcionado com a vida. Na época eu estava no quinto período do curso de adminstração e resolvi que deixaria a universidade. Não de vez. Mas tranquei a matrícula para dar continuidade mais tarde.

A convite de um amigo, resolvi pedi demissão da Rádio. Juntei as minhas economias e parti para Florianópolis – Santa Catarina. Com fitas gravadas do meu trabalho e alguns currículos buscava por uma recolocação. Todavia, o mercado de radialista é pequeno e muito competitivo. Mas só me dei conta disso algum tempo depois. As leituras agora mudaram radicalmente. Leia anúncios de emprego.

De anúncios em anúncios fui vivendo até ser chamado para trabalhar numa rádio em São Paulo Capital. Não conhecia ninguém. Tinha apenas um contato: a secretária da Rádio que havia me chamada para trabalhar. Foi, verdadeiramente, uma aventura de juventude. Tinha nesse período 23 anos. Mudança radical! De conhecido e famoso para mais um no meio da multidão. Mais um em meio a milhares de rostos desconhecidos. Aluguei um quarto em um apartamento no bairro Higianópolis, bem próximo do prédio onde morava Fernando Henrique Cardoso. Consolação e Angélica eram avenidas de trânsito freqüente na ida ou na volta das visitas que fiz pela cidade. Para trabalhar, tinha que usar duas conduções: o metrô e o ônibus. Em pouco tempo as economia foram ficando escassas e o jeito era ficar no apartamento. Saindo somente para rádio à noite para trabalhar.

Uma crise financeira da Rádio em que trabalhava me obrigou a pedir demissão e, apesar de já ter outro lugar para trabalhar, a saudade da família, da namorada e dos amigos forçaram-me a uma decisão de retorno.

De novo em Guajará-Mirim, já não representava ameaça. A não ser para os padres e as freiras. Voltei ao cenário público da cidade como pessoa a ser evitada. Eu era um herege! Merecia a fogueira. Foram alguns meses em busca de emprego sem conseguir nada. Era bom profissional, conhecido, competente, mas agora era evangélico. Novos amigos, novos livros.

Em janeiro de 1998, Herivelton José, me convidou para assumir a direção comercial da Rádio Rondônia. Aceitei, mesmo não sendo o que mais gostava de fazer. Precisava do emprego. Fiquei na Rádio até dezembro. Em fevereiro de 1999, ingressei no magistério municipal. Um mês depois me casei. Nova fase da vida. Novos Livros! Agora com mais responsabilidade. Não havia mais espaço para as aventuras. Estava no momento de parar e pensar num caminho a seguir. Tinha agora uma esposa para cuidar, uma vida a dois para viver. Novos livros para ler.

Em 1999, faço um novo concurso para professor na prefeitura Municipal de Guajará (eu havia feito um em 1993 e não assumi porque preferí ser locutor). Aprovado, vou dar aulas na escola Irmã Hilda. Decido então a fazer um novo vestibular e opto por letras-português. Agora sim, por convicção. As leituras agora ganham uma dimensão científica e, aos poucos, vai delineanda minha escolha profissional. Já não faço o curso por fazer. Há em mim uma dedicação, uma vontade de SER MAIS. Durante os quatro anos de curso, mudei de local de trabalho várias vezes. Fazia meu trabalho e estudava. Tinha muita pressão ainda devido às posições ocupadas anteriormente por mim. Mas agora a minha preocupação era com a universidade, com minha vida acadêmica, com as teorias, inicialmente dos outros, depois as minhas.
Concluí o curso em agosto de 2004. Finalmente! Ah! Fui o orador da turma. Guardo até hoje o discurso que fiz naquele dia.

Já não havia mais nada que me prendia a Guajará. Pedi afastamento da Prefeitura e vim para Vilhena... queria ser professor universitário, escrever livros, sistematizar teorias.

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